por Teofilo Tostes
Vertigem em Cartagena II
Parei no dia de ontem, na entrada do museu de arte moderna de Cartagena. No intervalo de tempo que se passou, a narrativa ficou em suspenso, como nós na entrada do museu, lendo as palavras de Garcia Marques (*) sobre aqueles quadros ali reunidos, que enfim encontraram paredes para permanecerem juntos.
Mas o que junta obras tão diversas, de artistas que, por vezes, parecem guardar uns dos outros, distâncias intransponíveis? Lá dentro, encontramo-nos novamente com Enrique Grau, o que já era esperado. Há uma sala somente de obras dele, e por meio delas podemos supor alguns caminhos percorridos por ele, o que permitiu que ele se tornasse o artista que tanto nos havia impressionado no dia anterior. Na minha lembrança, certamente retorcida pelo relato e pela invenção, no centro desta sala se encontra a “Noche oscura del alma”. Busco, mas não encontro a chave que me permite abrir a porta desse eco dos versos de Juan de la Cruz. Mas isso não apaga, nem o eco, nem a forte impressão que ela deixa.
Tirando a reunião dos trabalhos de Grau, não encontrei o que reunia aquelas obras, a não ser o fato de estarem sob o mesmo teto institucional e permanecendo em suas paredes.
No vertiginoso dia de ontem, dali rumamos para o bar das Bovedas de Santa Clara. Creio que ninguém teve, naquele instante, a mesma ideia, para nossa sorte. Assim, pudemos descansar um pouco da agitação daquela manhã e do calor inclemente. Para isso, foi necessário água, refrigerante, uma limonada, tortilhas e um delicioso pan de bono com salsa chimichurri. E o tempo do descanso que o corpo exigia.
Depois do café, saindo das Bovedas de Santa Clara, ouço português pela primeira vez, em nossa viagem, não falado por nós mesmos.
Não satisfeitos com a vertigem do dia de ontem – até então – decidimos rodar a cidade numa carruagem.
E para sorver até a última gota desse dia, banquete no “El Santíssimo”, no qual comemos, creio, a melhor entrada de nossas vidas – uma espécie de queijo camembert empanados, num molho indecente. Puro pecado!
OBS: A única nota destoante do dia foi descobrirmos que a casa de Gabriel Garcia Marques é simplesmente a casa de Gabriel Garcia Marques e, como a minha casa, é simplesmente uma habitação particular, e não um museu. Essa obviedade não nos passou pela cabeça e, ao tentar visitar aquilo que imaginávamos, acabamos em frente a uma bela casa – como tantas outras em Cartagena – fechada – como tantas outras em Cartagena –, a mirá-la, do lado de fora, estupefatos diante do que seria o mais lógico supor…